4/26/2008

CAPITALISMO 4

LOPEZ-SÉBILLE, Philippe, Geopolíticas do Petróleo, ed. Piaget, 2006.
“a ausência de um fórum internacional dedicado a uma cooperação indispensável sobre a situação e as perspectivas do mercado petrolífero fez-se duramente sentir.” (Pág. 394).

“Paralelamente a esta subida de preços, provocada basicamente por um consumo cada vez mais elevado, as emissões de gases com efeito de estufa aumentam também consequentemente. Esta bulimia petrolífera mundial corre o risco de ser duplamente custosa.
Para muitos analistas (…) o recurso ao petróleo corre o risco de ser limitado mais pelas restrições ligadas aos gases com efeito de estufa do que pela rarefacção de recursos.” (Pág. 395).

“É comum citarem-se duas causas principais na origem do mau desenvolvimento de muitos países produtores de petróleo: (…) deixar perigar a maior parte das actividades económicas do país apoiando-se sempre mais nos rendimentos do petróleo; as receitas (do petróleo) não incidem no desenvolvimento de outras fontes de riqueza (…) a opacidade que preside à atribuição das concessões e dos contratos petrolíferos ou a gestão danosa das receitas do petróleo (…) estimula uma corrupção já omnipresente nos aparelhos de Estado. (…) Sem uma plena e inteira colaboração dos governos, sinónimo de um abandono voluntário de soberania, o petróleo como outros recursos minerais em África e noutros lugares, pode ajudar a sair do subdesenvolvimento? O EITI foi criado para responder afirmativamente a esta questão. Esta iniciativa de várias ONGs (…) visa reforçar a transparência das operações financeiras entre companhias extractoras e os Estados. (…) Sobressaem disparidades de transparência de um país para o outro, de uma companhia para outra. Este aspecto pode fazer pensar que, em função do seu peso na produção do país, da importância do país na sua estratégia de conjunto e, claro está, dos dirigentes do país, as companhias elaboram diferentes normas e que, em matéria de transparência, não pode haver uma regra.” (Pág. 399, 400)

“É evidente que o EITI é o primeiro passo no bom sentido, mas há um caminho muito longo” (Pág. 401)

“Esta falta global de transparência a todos os níveis do negócio sublinha a pouca fiabilidade de certas previsões estatísticas dos Estados produtores, ainda que toda a gente esteja mais ou menos de acordo sobre os volumes globais. No fundo o sistema assenta quase exclusivamente nas declarações dos principais intervenientes, não verificáveis e não verificadas de maneira independente.” (…) A prioridade actual, na falta de uma solução milagrosa, consiste em desenvolver urgentemente (…) “carburantes verdes”. (Pág. 402).

”A crise que actualmente atravessamos ainda não é um choque petrolífero mas antes um aviso. Provocará algumas mudanças num sistema global que apresenta tão ostensivamente os seus limites? Dará início a um debate de fundo mais alargado, seguido por medidas concretas sobre as energias, uma melhor utilização dos recursos petrolíferos e uma certa forma de antecipação do depois do petróleo? Tantas novas incertezas… Contudo quem é que molda simultaneamente os nossos modelos de sociedade e alimenta o seu crescimento económico, sem falar de eventuais perspectivas de desenvolvimento nos países que, neste momento ainda estão privados dele? O consumo de energia.
Em África há sol, rios, vento e também petróleo e gás mas, na melhor das hipóteses, para outros mercados: apenas 10% da população têm acesso à electricidade (…) De que tipo de desenvolvimento é que se fala há quarenta anos, e como travar a imigração nestas condições?” (Págs. 406/7)

4/25/2008

ENTRANHA 5 Rua Augusta... (3)

Receita para dinheiro

Ingredientes:
- um menor
- um acordeão
- um cãozito
- um cesto pequeno
- transeuntes mal formados.

Torture-se privadamente o cãozito para que permaneça imóvel e de cesto na boca horas a fio.
Ate-se o menor ao acordeão para que do instrumento saia qualquer coisa que pareça música.
Se a receita for bem preparada, os transeuntes mal formados colocarão moedas no cesto, indiferentes:
- Ao adulto que repimpadamente recolhe em casa o dinheiro do negócio.
- À tortura do cão.
Também se pode juntar ao cozinhado, em guisa de molho, uns tantos aue fotografam a cena, levados pela “beleza” do quadro.
Serve-se frio diariamente na Rua Augusta – ou no metro – perante a mudez das associações animais e do fisco.

4/24/2008

ENTRANHA 6 Rua Augusta (2)

Nada é vão.
Esperava chegar ao contentor do entulho e, juntamente com as demais inutilidades que o tempo fabricou, atirar com um dos troféus ganhos num concurso de encenação, onde me atribuíram o segundo e o primeiro prémios - a estatueta relativa a este último safou-se do lixo porque no gabinete do conselho executivo da escola - a Passos Manuel - que então representava - mas pensava eu que, chegando ao entulho, a coisa correria calma, discreta e mesmo silenciosa, apesar do que carregava: um candeeiro, uma tenda, enfim, uma colecção de tralha, como num jogo de bonecas russas: difícil é deitar fora a primeira.
E todavia...
Todavia, no entulho, numa rua traseira à Augusta, logo dei com um grupo de imigrantes, porventura ciganos, metidos no contentor.
- Traz roupa, senhor? - perguntou um.
Não sou parvo, acho-me mesmo lúcido e desfazer-se de troféus exige despojamento. Mas praticá-lo perante os olhos ávidos de uma chusma de miseráveis é vitória sobre si próprio ou já vaidade redundante? E não desvalorizei eu o troféu - e ao seu companheiro primeiro, lá na escola porventura ainda a salvo - no dia em que os mesmos que, em nome das tais habilidades teatrais, mo entregaram, me recusaram um apoio para encenar?
Atacado por vozes e gente, já num turbilhão de sentimentos, atirei o símbolo para o contentor e logo mãos ávidas o agarraram:
- É pesado, senhor!
- E maciço! – desabafou outro.
Na hora da despedida o meu "óscar" teve finalmente a sua consagração.
Nada é vão.

4/22/2008

BIOLOGIA 2

RIDLEY, Matt, A Rainha das Copas, o sexo e a evolução da natureza humana, Ed. Gradiva, 2004
“À medida que a vida emergiu do caldo original há vários milhares de milhões de anos, as moléculas que se multiplicaram à custa de outras tornaram-se mais numerosas. Depois algumas dessas moléculas descobriram as virtudes da cooperação e por isso começaram a juntar-se em grupos, chamados cromossomas, para gerirem máquinas chamadas células, que podiam replicar esses cromossomas eficientemente. Do mesmo modo, pequenos grupos de agricultores juntaram-se a ferreiros e carpinteiros para formarem unidades cooperativas chamadas aldeias. Os cromossomas descobriram depois que vários tipos de células podiam formar uma supercélula do mesmo modo que as aldeias começaram a juntar-se, formando tribos. Foi esta a invenção da célula moderna a partir de uma equipa de bactérias diferentes. Depois, as células agregaram-se para formarem animais, plantas e fungos, grandes conglomerados de conglomerados de genes, tal como as tribos se fundiam em países e os países em impérios. Nada disto teria sido possível para a sociedade sem leis que forçassem o interesse social sobre o impulso egoísta do indivíduo, sendo o mesmo válido para os genes. Um gene tem apenas um critério pelo qual é julgado pela posteridade: tornou-se um ancestral de outros genes. Em larga medida tem de o conseguir à custa de outros genes, tal como um humano adquire riqueza principalmente ao persuadir outros a separarem-se dela (legal ou ilegalmente).” (Pág. 104)

Na actualidade existem 3 equipas de cientistas americanos que procuram o “gene da homosexualidade” (…) A mais apelativa das novas evidencias sobre o gene homossexual é que os gémeos falsos, que se desenvolveram no útero e foram criados no mesmo ambiente familiar, apenas têm uma hipótese em quatro de partilharem o mesmo hábito homossexual. Por outro lado, os gémeos verdadeiros, criados no mesmo ambiente e com os mesmos genes, têm uma hipótese em duas de partilharem o mesmo hábito homossexual. Se um gémeo verdadeiro é homossexual as hipóteses de o irmão gémeo também o ser são de 50%. (Pág. 295)

“Se as preferências sexuais dos humanos homossexuais são grandemente influenciadas (e não completamente determinadas) por um gene, então é provável que as preferências dos heterossexuais também o sejam. (Pág. 296).

“apenas compreendendo como é que evoluiu a atracção sexual será possível fazer sentido a mistura de cultura e instinto e compreender porque mudam certas características como a moda e outras resistem.” (Pág.297)

ENTRANHA 7 Capital e natureza

A questão que levanta a frase "o capitalismo é o estado natural do homem" é a de saber se devemos aceitar o dado tal qual, isto é, se o humano é um dado ou um ponto de chegada.
Caso seja um dado, devemos então preservá-lo o melhor possível e não lhe alterar as características. Caso o dado seja apenas algo a ter em conta para uma possível educação - nos animais chamar-se-à amestração - então esse mesmo dado é apenas um entre tantos. Assim o humano está feito quando nasce - e desenvolverá naturalmente o capitalismo - ou deveremos intervir para que ultrapasse a natureza e se crie outro?
A experiência diz-nos que somos o produto de uma educação e que a ideia de um humano “natural” é um lirismo.
Portanto, resta-nos a formação.
Formar homens e mulheres capitalistas, isto é, que ponham a frente de tudo o mais o apelo pelo lucro? O objectivo é absurdo, pois a meta da educação deverá ser a reintegração do humano na natureza, apesar do obstáculo da cultura.
Na prática reintegrar na natureza significa preservá-la, lá onde não seja indispensável destruí-la, isto é, agir à semelhança do mundo natural: por imperiosa necessidade. Esta obrigar-nos-á, porque o sol se extingue, a abandonar o planeta.

Rua Augusta 1


Já no metro, sim senhor, é-se na rua, deixou-se a cama e talvez se volte – para quê certezas? Só empecilham! – se a noite cair ou os que me acompanham na ida, forem também na volta: vida de conjunto.
Ontem – ou antes ainda – o telé roubado do bolso pois gripes, chatos e carteiristas fazem parte da massa e a cada um seu quinhão: amanhã eu, depois tu e, por fim, tanto faz, se não roubo também não restituo. Ah, se matar fosse legal ou mesmo premiado.
No barco – passou-se do combóio para a barcaça prisioneira do Tejo – o Sol chapinha no convés e, por momentos, a luz do dia, ainda púbere, promete êxtases. Mas logo a viagem acaba – tantos que nem florescem - e outros galgam para a barca, desejosos do mesmo cais donde há pouco partiram.
Insatisfação nas caras, deformadas na pressa, no desencontro entre fazer agora e pensar num antes ou depois. Correr. Corrida. Contra o próprio de cada um, suicídio eficaz que florescerá na sargeta ou na reforma. Ou em ambas simultâneamente
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