7/06/2008

CAPITALISMO 17 (J.S. é prémio nobel de economia)

STIGLITZ, Joseph E., Tornar Eficaz a Globalização, Porto, Ed. Asa, 2007. (413 pp. Ca. 18 euros)
“Hoje está generalizada (…) uma compreensão das limitações do mercado. Os escândalos dos anos 90, na América e noutros lugares, derrubaram o “Estilo Financeiro Capitalista Americano” do pedestal onde se encontrava há demasiado tempo.
(…) Há também um reconhecimento cada vez maior de que não existe apenas uma forma de capitalismo, nem uma só maneira “corrente” de gerir a economia. Há, por exemplo, outras formas de economia de mercado – como a da Suécia – que conduzem a sociedades bastante diferentes, marcadas por melhores cuidados de saúde, melhor educação e menor desigualdade.
Enquanto que a versão da Suécia pode não funcionar tão bem noutros sítios (…) o seu êxito demonstra que há maneiras alternativas de economias de mercado eficazes. E quando há alternativas e opções, os processos políticos democráticos devem estar no centro de tomada de decisões – e não os tecnocratas. Uma das minhas críticas às instituições económicas internacionais é que tentaram pretender que não havia trade-offs – um único conjunto de políticas que faria com que todos ficassem melhor – enquanto a essência da economia é a escolha, pois há alternativas que beneficiam alguns grupos (como os capitalistas estrangeiros) à custa de outros (…) Entre as opções centrais com que se deparam todas as sociedades está o papel do Estado. O sucesso económico requer que se alcance o equilíbrio entre o Estado e o mercado.(…) Mas eu argumentaria que a globalização, da maneira como tem sido aplicada, tem dificultado frequentemente, a obtenção do necessário equilíbrio.” (pp.13,4)

“Claro que aqueles que estão descontentes com a globalização económica geralmente não objectam com o maior acesso aos mercados globais, ou à disseminação do conhecimento global. Mas levantam cinco questões:
· As regras do jogo são injustas, especificadamente concebidas para beneficiar países industrializados avançados. De facto, algumas mudanças recentes são tão injustas que fizeram com que alguns dos países mais pobres piorassem realmente.
· A globalização promove valores materiais acima de outros valores, como a preocupação com o ambiente ou a própria vida.
· (…) a globalização tem retirado uma boa parte da soberania aos países em desenvolvimento e da sua capacidade de tomarem decisões em áreas fundamentais que afectam o bem-estar dos seus cidadãos. Neste sentido tem minado a democracia.
· Enquanto os defensores da globalização têm vindo a argumentar que toda a gente beneficia economicamente, há provas abundantes, tanto nos países desenvolvidos como nos países em desenvolvimento, de que haverá muitos prejudicados em ambos.
· Talvez o ponto mais importante, o sistema económico que tem sido imposto aos países em desenvolvimento (…) é inadequado (…). A globalização não deveria significar a americanização nem da política económica nem da cultural mas frequentemente é o que sucede – e isto tem provocado ressentimento (pp.33,4)

“(…)a maneira como se tem tomado decisões – a governança – na arena internacional sofre de dois males: a voz dos países em desenvolvimento é ouvida de menos e as vozes dos interesses especiais são ouvidas de mais” (p.172)

“Uma coisa que me dá alguma esperança é o movimento de responsabilidade social das empresas. (…) A Sociedade Civil está também a desempenhar um papel cada vez mais activo, ao vigiar a actuação das grandes companhias mineiras e as industrias que prejudicam os trabalhadores. (…) A responsabilidade limitada tem estado subjacente ao crescimento do capitalismo moderno mas, com a globalização, as infracções de responsabilidade limitada têm vindo a assumir uma escala global; sem as reformas que aqui se sugerem podem tornar-se muito piores. A lição é simples (…) os incentivos são importantes e os governos e a comunidade internacional têm de trabalhar mais para garantir que os incentivos com que as empresas se confrontam estejam alinhados com aqueles a quem estes afectam, especialmente os menos poderosos no mundo em desenvolvimento” (pp. 267,8)

Sob a epígrafe “Tornar eficaz a globalização” (p.253) e no respeitante ás multinacionais, J.S. propõe [resumo]:
- Responsabilidade social das empresas.
- Limitar o poder das empresas.
- Melhorar a governança empresarial.
- Leis globais para uma economia global.
- Reduzir o âmbito da corrupção.

SAÚDE 1

SHAH, Sónia, Cobaias humanas, Casal de Cambra, Ed. Caleidoscópio, 2008
“Precisamos de abrir o debate acerca da própria ideia de usar corpos humanos como matéria de experiência. Para alguns desempenhos a função da cobaia em testes experimentais é o mesmo que, por exemplo, aceitar um trabalho na fábrica.” (pp. 18,19)

“Enquanto forem necessárias abordagens inovadoras para os dilemas da saúde imposta, por exemplo, pela falta de água potável e comida em boas condições, a resposta não está nos fármacos de marcas novas. E mesmo quando os produtos novos são, de facto, o que é mais necessário, desde novos fármacos contra a malária até tratamento contra a doença do sono, aqueles que ajudam os mais pobres, geralmente, têm pouco interesse para as empresas farmacêuticas, as quais se comprometem com as necessidades financiáveis dos seus investidores. O resultado mais possível será uma classe de ricos rodeada de fármacos, lado a lado com os pobres com falta de medicamentos. (…) “O desastre da talidomina marcou um ponto de viragem para a indústria farmacêutica em crescimento. Enquanto o escândalo revelou, sem dúvida, a insensatez de confiar nas empresas farmacêuticas direccionadas para o lucro (..) a legislação que surgiu no seguimento dessa situação não exigiu que a indústria se reorientasse no sentido da boa saúde da sociedade. Em vez disso, as novas regras exigiram que a indústria aumentasse amplamente as actividades experimentais, que eram tidas em grande conta. Agora a procura de corpos para as experiências começaria a sério (p. 71)

“Escute (…) investigadores biomédicos (…) e irá certamente ouvir comentários espantosos sobre experiências em seres humanos feitas no passado, quando audaciosos testes, sem regulamentos onerosos, produziam resultados impressionantes. Experimentação deste tipo, dirá o cientista de investigação, infelizmente já não é possível “devido a preocupações de teor ético”. (…) É difícil imaginar alguém a falar de contratos de exploração, derrames de petróleo ou desfalque de empresas como não sendo possíveis “devido a preocupações de teor ético”. (…) Mas quando os investigadores clínicos enganam pacientes, exploram a sua pobreza ou desviam recursos escassos da sua assistência médica, tal não é considerado um mal genuíno. A actividade principal da investigação médica – fazer progressos ao nível da melhoria da saúde, salvar vidas – ofusca isso. A exploração e as violações dos direitos humanos são apenas efeitos secundários.
Dominar estes “efeitos secundários”, exige, em primeiro lugar, que se ponha de lado o mito à volta da investigação médica que os estabelece como “efeitos secundários”. (…) Mas se a investigação clínica é uma indústria, que se guia segundo os seus próprios interesses, então não há razão para lhe permitir espaço de manobra especial, para fechar os olhos quando (…) infringem as regras.
(…) Devíamos exigir que os acordos para as cobaias – por exemplo o acesso aos fármacos de estudo depois de o teste terminar – fossem justos e bons no presente, e não num futuro especulativo, quando os preços baixarem ou a pobreza acabar e outras pessoas aplicarem soluções melhores.
Tais requisitos, que podiam ser incorporados nas regras da FDA, serviriam como correctivos lógicos para a indústria competitiva e direccionada para o lucro, em que a investigação clínica actualmente se transformou. Mas isso faz questionar-nos se, em primeiro lugar, realmente queremos adoptar esse modelo” (pp. 253 a 255).





Arquivo do blogue