3/30/2008

CAPITALISMO 6

GREENSPAN, Alan, A Era da Turbulência Contribuição para um Mundo em Mudança, Presença, 2007
“O que está a acontecer é que milhões de negociantes de todo o mundo procuram comprar títulos subvalorizados e vender aqueles que parecem ter um preço exagerado. É um processo que melhora continuadamente a eficiência de canalização das escassas poupanças para os investimentos mais produtivos. Este processo, apesar de caracterizado pelas críticas populistas como especulação, contribui em muito para o crescimento da produtividade de um país e do seu nível de vida. Porém, a incessante procura de vantagens vai equilibrando continuadamente a oferta e a procura, a um ritmo demasiado rápido para a compreensão humana. Forçosamente os negócios estão a ficar cada vez mais computarizados, e a negociação “ruidosa” no centro do salão da bolsa de Valores ou de Mercadorias está a ser rapidamente substituída pelos algoritmos dos computadores. (…) a distinção entre o que constitui finanças e comércio desaparecerá em grande parte.
Os mercados tornam-se demasiado grandes, complexos e acelerados para estarem sujeitos à supervisão e às normas do século XX. Não admira, então, que este monstro financeiro globalizado ultrapasse a plena compreensão até dos mais sofisticados participantes no mercado. Os reguladores financeiros têm de fiscalizar um sistema bem mais complexo do que o existente quando as normas que regiam os mercados financeiros começaram por ser escritas. Hoje, a fiscalização destas transacções processa-se essencialmente através da vigilância individual dos parceiros intervenientes no mercado. Cada entidade de crédito protege os seus accionistas e controla as posições dos investimentos dos seus clientes. Os reguladores podem continuar a fingir que fiscalizam mas as suas capacidades estão muito diminuídas e tendem a reduzir-se ainda mais. Durante mais de dezoito anos, eu e os meus colegas do Conselho de Governadores presidimos a grande parte deste processo no FED. Só tardiamente nos apercebemos de que o poder de regular administrativamente estava a desaparecer. (…) Dado os mercados se terem tornado demasiado complexos para a intervenção humana eficaz, as políticas anti-crise mais promissoras são aquelas que mantêm a máxima flexibilidade do mercado, liberdade de acção para os principais participantes no mercado, como os fundos de risco, os fundos privados de acções e os bancos de investimento.
(…)Muitos críticos acham perturbadora esta confiança na mão invisível como precaução e reforço, perguntam-se não deveriam os agentes financeiros mundiais como os ministros das Finanças e banqueiros centrais procurar regulamentar esta nova e imensa presença global? Há quem defenda que, se não fizer bem, a regulação global não fará mal. Mas faz. A regulação, pela sua própria natureza, inibe a liberdade de acção do mercado e é essa liberdade de agir expeditamente que reequilibra o mercado. Elimine-se a liberdade e todo o processo de equilíbrio do mercado é posto em risco. (…) No mundo dos nossos dias, não consigo ver de que forma um aumento de regulação governamental poderia ajudar. A recolha de dados sobre os balancetes dos fundos de risco, por exemplo, seria inútil uma vez que provavelmente estariam obsoletos antes de a tinta secar. Deveríamos criar um sistema de informação global com as posições dos fundos de risco e fundos de acções privadas para ver se existem quaisquer concentrações que possam indiciar riscos de implosões financeiras? Há quase seis décadas que lido com relatórios dos mercados financeiros. Não conseguiria determinar através desses relatórios, se as concentrações de posições reflectiam de facto a actividade que compete aos mercados – eliminar os desequilíbrios do sistema – ou se estaria para surgir algum negócio perigoso. Surpreende-me-ia deveras se alguém o conseguisse. Na verdade a “mão invisível” pressupõe que os participantes no mercado ajam de acordo com os seus interesses. E há ocasiões em que as pessoas correm riscos manifestamente desnecessários. (…) Globalmente, o quadro de problemas financeiros com que o próximo quarto de século se confronta não é muito risonho. No entanto já suportámos bem pior. Nenhum deles afectarão para sempre as nossas instituições, nem sequer é provável que derrubem a economia americana do seu lugar de liderança mundial. (Págs. 524/526)
“Até que ponto é o nosso actual sistema, desenvolvido para um mundo em que os valores físicos predominavam, adequado a uma economia em que o valor é cada vez mais consubstanciado em ideias e não em capitais palpáveis? Infelizmente, a decisão económica mais importante que os nossos legisladores e tribunais enfrentarão nos próximos vinte e cinco anos é a redefinição das regras da propriedade intelectual.” (Pág. 533)
“A situação da Europa Ocidental permanecerá pouco clara até os europeus concluírem que não podem manter um Estado-providência que exige uma população cada vez maior para o financiar. Com a sua taxa de natalidade muito abaixo do ritmo de substituição natural e pouco as previsões que antevejam uma recuperação, a força de trabalho da Europa Continental, a menos que seja significativamente reforçada por novos trabalhadores emigrantes, tende a diminuir e o número de idosos e dependentes a aumentar. Contudo a Europa não mostra vontade de acolher mais imigração. Para combater tudo isto, a produtividade da Europa teria de aumentar a um ritmo que parece estar fora do seu alcance. Reconhecendo este problema, o Conselho da Europa avançou em 2000, com um projecto ambicioso, a Agenda de Lisboa, para tornar a tecnologia do continente líder mundial. No entanto o programa sofreu atrasos e acabou por ser suspenso. Sem aumento de produtividade, é difícil ver de que forma a Europa pode continuar a manter o papel dominante que desempenhou na economia mundial desde o final da II Guerra Mundial. Mas o aparecimento de novos líderes na França, na Alemanha e na Grã-Bretanha pode constituir um sinal de que a Europa irá fortalecer o seu compromisso com os objectivos de Lisboa. A aparente convergência de perspectivas económicas de Nicolas Sarkozy, Ângela Merkel e Gordon Brown fez que o ressurgimento da Europa se afigure mais provável.” (Pág. 535)

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