4/07/2015

Derrotar o dragão, ganhar o reino…


Na nossa memória residem as histórias em que os vencedores se  tornam reis e recebem como prémio a princesa. A revolução portuguesa de Abril gerou os seus heróis e este terá sido o último período na nossa história recente em que o herói passou dos feitos que o celebrizaram para a possibilidade de presidir à comunidade: Otelo, candidato à presidência e Eanes ganhando-a, foram exemplo.  Hoje os possíveis candidatos a presidentes são ex-ministros (Guterres, Santana), dirigentes de organismos com importância social (Nóvoa, Carvalho) ou uma vedeta mediática (Rebelo Sousa).  Além é claro, de aventureiros que, sem outro calibre que o da ousadia e vontade de domínio, mas com poder económico ou apoiados por partidos,  venham ainda a apresentar-se a combate, exibindo quase sempre a espada da justiça, a que miticamente mais recolhe.  (Neste horizonte talvez se venham a perfilar Amaral e Martinho.)
Entre os atuais candidatos não há uma única mulher, (embora Roseta esteja disponível), Carvalho está demasiado perto do PC (que continua estalinista)  e a Nóvoa e Sousa  ninguém lhes conhece decisões públicas em situações conturbadas – ou mesmo pacíficas. E isto quando os tempos são de luta entre uma europa obediente à alta finança e os povos prejudicados pelo jet-set Bruxelense.
De facto os heróis escasseiam e a cinzenta paisagem europeia só coloriu um pouco nos últimos tempos, a nível nacional, com o aparecimento do Livre, que obrigou a mudar o tom da política em Portugal – levando o PS a assumir igualmente eleições primárias – e, no estrangeiro, pela votação no Syriza. Porque mais democracia é o que, aqui e agora, se precisa a fim de que se ouçam os desempregados, os que não colhem dividendos de ações, os que, afinal só podem contar com o seu (cada vez mais inseguro) local de trabalho, como fonte de rendimento. E um presidente – ou presidenta – para que possa ajudar esta grande maioria necessita de, além das curriculares qualidades que já todo o mundo propaga,  possuir ainda em grande escala as seguintes competências:
·        Gostar de gerir situações de instabilidade (decorrentes nomeadamente da eleição de partidos sem maioria), e gerar consensos quando toda a gente se abespinha;
·        Ser capaz de ver soluções para além daquelas que todos apresentam – e portanto ser inovador;
·         Ter empatia pelas classes mais depauperadas para apoiar, em caso de necessidade, David contra Golias;
·        Ser alguém de “mãos limpas”, isto é, não se ter envolvido com anteriores governos – os quais, melhor ou pior, todos gaiteiramente contribuíram para a ruína portuguesa.

Qual dos atuais candidatos é virgem, derrotou o dragão e merece a princesa (ou príncipe)? 

7/11/2014

Comunidades Portuguesas

http://www.secomunidades.pt/web/guest/PostosConsulares

12/24/2013

19 A mãe e os irmãos de Jesus foram vê-lo, mas não conseguiam aproximar-se dele, por causa da multidão.
20 Alguém lhe disse: "Tua mãe e teus irmãos estão lá fora e querem ver-te".
21 Ele lhe respondeu: "Minha mãe e meus irmãos são aqueles que ouvem a palavra de Deus e a praticam".
Lucas 8


Oh vós outros que fizesteis filhos, juntasteis esposas e constituísteis famílias, eu vos saúdo, esta é a vossa noite, eia várias vezes e sede felizes! Senti o bafo dos parentes, o calor do lar e os afagos dos netos, mais a paga dos sacrifícios em nome da palavra dita “ Ide e multiplicai-vos!” E assim fizestes, e assim crescesteis e deste modo mereceis homílias e louvores, abonos de família e prémios de fertilidade!
Eu, que me afastei, que repudiei pai e mãe para ser do mundo e mundo me tornei, eis que  ora digo: basta de ver as coisas por um só prisma e floresçam mil caleidoscópios!
Eu, e os meus gado, eu e os meus outrora criados doravante empregados  e amanhã sabe-se lá o quê, eu e o meu homem, e eu, mulher,  aqui enlaçada na minha amiga, queremos também desse naco de rei, dessa mesa que ora se estende e é também nossa, pois família somos! Sem filhos, sem fêmea ou macho mas machos e fêmeas  e mesmo tu, só, e Único, não digas que não nos pertences, pois bem alto clamaste – “Quem é minha mãe, quem são meus irmãos?", -  lembras?, logo trocando-os por este mundo.
Assim, eu só, vestido apenas de estrelas, com o azur por abafo e o luar por ‘conchego,  sinto-me de ti e não blasfemo, apesar de sem filhos, apesar de sem esposa, neto, bisnetos, descendência, enfim, além da que lanço e dou ao vento. Sim, a minha progénie é fátua, etérea, nula mas o mundo a colhe e ma devolve tornando-me menos só se é que a solidão num orbe de massa não traz antes a purificação do que não cola nem gruda e, logo, não cristaliza. Sim, eu o só, eu o sem mulher, eu o sem filho, eu o sem eira nem beira e que às telhas abomino, quais lares de que fujo para me sentir sempre inteiro, eu o asco que não quer companhia nem hálitos humanos à volta, todo em desumanidade me vindo e escoando universo. Eu, o nada, o gasoso, o vinho sem boca, o deus sem crente ou o crente sem quem, o que não procria ou o fértil que se castra, em suma!  E que importa? A felicidade é minha, inda que dela não saiba senão a busca e nisso igual a qualquer lar, pátria, altar ou o que seja e, provavelmente, também desespero!
Vem, sim, Tu que nesta noite natalícia te enfeitas e dizes Tua, vem e sê-me a companhia, pois eu a todos quero da mesma forma que outros ao filho, ao neto, à esposa, em acordo com o Teu verbo de que “mãe e irmãos são-me os que O ouvem e praticam!” oh, eu não Te acredito mas é verdade que sigo, como cego que não vê o caminho e todavia vai, nem já sabe porquê mas de certeza porque não pode fazer outra coisa! Pois haverá outra possibilidade além da de querer ao vizinho como a nós mesmos, respeitar a outrem – verme ou humano -  como se os foramos? Por isso, meu igual e meu pária, Tu que recusaste família e morreste só na cruz – ou lá o que foi que depois de ti contaram! – Tu, que sofreste a ignomínia e a cicuta – e também te chamaste Sócrates - contenta-te agora da minha companhia, pois te pertenço e todavia fujo,  sempre na ânsia de chegar mais além, a mais outro e outra ainda e não ser presa de ninguém. Não, não tenho medo da via mas não me prendas, não me queiras Teu, pois não Te sou e muito menos de mim mesmo! (E tomara ser! Tomara ser todo eu… ) Mas o quê, também me chamam à porta? Como outrora Teus irmãos e tua mãe? Ora, quem os tenha logo os ature! Eu… Eu sou puro nada, suicidei-me nas alturas e agora… agora não sinto coisa alguma, mas dói-me toda a dor do mundo, sou a sua chaga absoluta. 
Que tenho a ver com o meu feliz irmão ou mãe?  Que riam e dancem as consoadas satisfeitas, a minha ceia é única e toda de gelo - ou rua - feita. A mesa… sou eu
Sofrimento, vem!



11/11/2013

YOUSAFZAI, Malala, Eu, Malala. Lisboa: Presença, 2013 Ca. 350 pp. e 16.99 euros

“No Paquistão, as madraças são uma espécie de sistema de segurança social, já que dão alimentação e alojamento gratuitos. (…)  Os rapazes aprendem o Alcorão de cor, balançando-se para a frente e para trás à medida que o vão recitando. Aprendem que não existe ciência nem literatura, que os dinossauros nunca existiram e que o Homem nunca foi à Lua.”  (p. 121)


“Uma das raparigas da minha turma não voltou à escola nesse ano. Casaram-na assim que chegou à puberdade. Era grande para a sua idade mas não deixava de ter apenas treze anos. Pouco tempo depois ouvimos dizer que tinha dois filhos. Na aula, enquanto recitávamos formulas de hidrocabornetos durante as nossas aulas de química, interrogava-me como seria abandonar a escola e, em vez disso, começar a tratar de um marido.” (p. 221)


Vide: malafound.org 

7/05/2013

MOHANDAS K. GANDHI, A Minha Vida e as minhas experiências com a Verdade, Bizancio: Lisboa, 2012 (Ca. 462 pp. e 22 euros)

 “Raramente conheci alguém tão leal à Constituição britânica como eu. Hoje, sei que o meu amor pela verdade estava na raiz  desse sentimento. Jamais pude simular a lealdade ou qualquer outra virtude” (p. 165)
“Se eu não tivesse conseguido desenvolver o autodomínio (…) teria descido a um nível demasiado baixo, e teria encontrado a minha ruína há muito tempo.”
(…)
A pessoa não deveria comer para agradar ao paladar, mas apenas para manter o corpo. Quando cada órgão dos sentidos presta serviço ao corpo e por meio dele à alma, o seu prazer especial desaparece, e só então ele começa a funcionar de forma natural” (pp. 292,3)



“A minha ideia nunca foi confiar as crianças a professores comuns. As suas qualificações literárias não eram tão essenciais quanto a sua fibra moral”  (pp. 377,8)




“Mas o caminho para a autopurificação é árduo e íngreme. Para a  atingir o indivíduo tem de se tornar absolutamente livre de paixões em pensamento, palavras e acções. Tem de elevar-se acima das paixões opostas de apego e ódio, atração e repulsa. (…) Sei que ainda não tenho dentro de mim esta tríplice pureza, apesar da minha constante e incessante luta por ela. É por isso que os elogios do mundo não me comovem, na verdade com muita frequência me doem.  (…) Mas sei que ainda tenho um caminho difícil a transpor. Devo reduzir-me a zero. Enquanto o homem não se colocar por livre e espontânea vontade como a última das criaturas não há salvação para ele.” (p. 449)

6/29/2013

megapiquenique no terreiro do paço...

O mundo coisa esparramou-se hoje no terreiro do paço e a multidão coisa acorreu a ver as coisas animais mais as coisas alimentares. No meio de intenso ruído – não música – suor e ainda gritos “olha aqui o porco!” “Vê além a vaca!”  tudo se tresmalhava por entre cheiros a estrume, adubo e polícia. A excepção a esta exposição coisa era Lisboa e o Tejo, as suas cores, enquanto no asfalto famílias inteiras, de perna escarrapachada e cueca a ver-se, destapavam catrefas de taparueres com comida requentada. Piquenique, não era? E o cantor-digestivo ao cair da noite - bela receita. Por entre corredores de gente esgaseada pela vida  e anúncios “Vá ao mega-piquenique, não falte, etc.” serpenteei de cela em cela, de talhão em talhão – “olha aqui  a melancia e além o melão”  - aprendendo que o girassol é uma planta e não um mamífero. Sim, este mundo coisa,  rural ou urbano que importa,  há-de chegar também ao fim e dá vontade de dizer – não fosse eu ateu embora religioso! – que, na expulsão do Paraíso, o pior não foi a condenação ao trabalho mas a plastificação da vida.

Libertação, precisa-se!
CMelo

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6/10/2013

Kanna Parag



KHANNA, Parag, Como Governar o Mundo em Tempo de Incerteza. Lisboa: ed. Presença, 2012 (ca. 290 pp.)


“Acima de tudo, os novos diplomatas conseguem motivar milhões de pessoas espalhadas pelo mundo a aderir às suas causas. E todos nós podemos ser como estes novos diplomatas (…) os novos diplomatas exercem já uma grande influência sobre o Departamento de Estado Americano e sobre organizações tradicionais no que diz respeito à fusão do poder político e privado num todo maior do que a soma das suas partes. Para além da Casa Branca e Whitehall (a sede do governo britânico) o Forum Económico Mundial e a Fundação Iniciativa Global Clinton são os novos postos de encontro para novos diplomatas” (p. 46,7)


“Terrorismo, pirataria, fomento da guerra e crime organizado fundiram-se num submundo público-privado, constituído por patrocinadores estatais e nefastos grupos obscuros. As dinâmicas de mercado são imunes aos debates moralizantes desde que existe procura, haverá sempre oferta.” (p.140)


“Os melhores resultados não derivam de uma falsa escolha entre público e privado nas sim da união do público e do privado.” (p.225)


“A nossa meta deveria ser um mundo autopoiético: autoregulador e em perpétua recriação. (…) Um mundo público-privado, híbrido e difuso, não é infalível e é seguramente mais complexo do que a ordemn existente na atualidade, mas é uma melhoria e não um passo atrás.”

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